segunda-feira, 22 de maio de 2017



Abraça-me

Quero ouvir o vento que vem da tua pele,
e ver o sol nascer do intenso calor dos nossos corpos.
Quando me perfumo assim, em ti, nada existe a não
ser este relâmpago feliz, esta maçã azul que foi colhida
na palidez de todos os caminhos,
e que ambos mordemos para provar o sabor que tem
a carne incandescente das estrelas.
Abraça-me.
Veste o meu corpo de ti, para que em ti eu possa buscar
o sentido dos sentidos, o sentido da vida.
Procura-me com os teus antigos braços de criança,
para desamarrar em mim a eternidade,
essa soma formidável de todos os momentos livres
que a um e a outro pertenceram.
Abraça-me.
Quero morrer de ti em mim, espantado de amor.
Dá-me a beber, antes, a água dos teus beijos,
para que possa levá-la comigo e oferecê-la aos astros pequeninos.
Só essa água fará reconhecer o mais profundo,
o mais intenso amor do universo,
e eu quero que delem fiquem a saber até as estrelas mais antigas e brilhantes.
Abraça-me.
Uma vez só.
Uma vez mais.
Uma vez que nem sei se tu existes.


Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'


Foto: https://www.pinterest.pt/cinafraga/

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