terça-feira, 5 de julho de 2022

 

 

 


 

Para Ti

 

Foi para ti

Que desfolhei a chuva

Para ti soltei o perfume da terra

Toquei no nada

E para ti foi tudo

 

Para ti criei todas as palavras

E todas me faltaram

No minuto em que talhei

O sabor do sempre

 

Para ti dei  voz

Às minhas mãos

Abri os gomos do tempo

Assaltei o mundo

E pensei que tudo estava em nós

Nesse doce engano

De tudo sermos donos

Sem nada termos

Simplesmente porque era de noite

E não dormíamos

Eu descia em teu peito

Para me procurar

E antes que a escuridão

Nos cingisse a cintura

Ficávamos nos olhos

Vivendo de um só

Amando de uma só vida.

 

 

Mia Couto, escritor e biólogo moçambicano. (1955)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

segunda-feira, 4 de julho de 2022

 

 


 

Dança de Junho

 

Em silêncio nas coisas embaladas

Vão dançando ao sabor dos seus segredos,

Nos seus vestidos brancos e bordados

Raios de lua poisam como dedos,

E em seu redor baloiçam arvoredos

Escuros entre os céus atormentados.

 

 

Sophia de Mello Breyner Andresen   poetisa e escritora portuguesa (1919-2004).

 

 in’ Dia do mar