sexta-feira, 31 de janeiro de 2020






Raro e vazio dia.
Calmo e velho dia.
Os membros lassos debruados deste cansaço sem porquê.

Raro e vazio dia,
assim inteiro e implacável
na solidão grave e trágica do meu quarto nu.

Perdido, perdido, este vagabundear dos meus olhos
sobre os livros fechados e decorados,
sobre as árvores roídas,
sobre as coisas quietas, quietas...

Raro e vazio dia
na minha boca pálida e pouca,
sem uma praga para quebrar a magia do ópio!
Fernando Namora

Meu corpo estiraçado, lânguido, ao logo do leito.

O cigarro vago azulando os meus dedos.

O rádio... a música...

A tua presença que esvoaça
em torno do cigarro, do ar, da música...

Ausência!, minha doce fuga!

Estranha coisa esta, a poesia,
que vai entornando mágoa nas horas
como um orvalho de lágrimas, escorrendo dos vidros
duma janela,

numa tarde vaga, vaga...




Fernando Namora, escritor português (1919-1989).

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020







A Valsa



Deixai que meu coração sonhe.
Pátios na lua,
Suspensos candelabros entre as nuvens.
A valsa num sopro de ventura.
Vestidos bordados a estrelas.
Jarrões suspensos ornados de narcisos.
Já entoa a valsa das flores.
Rodopiam pares, leves corações, como flutuam.
São elevações, suaves patamares.
Jovens casais de elegância aprumo.
Vos digo já que eu afinal.
Não sei se sonho.
Se tudo é verdade.
Porque faz de mim muito mais eu.
Estar dentro de um sonho.
Pois tudo se aparenta tão real.
Vou preparar-me para a valsa…
Resta-me sair do sonho e ser a cinderela,
Sem ter sapatos de cristal.
Eu!

Augusta Mar



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