quinta-feira, 7 de março de 2019





Mors Amor


Nesses tremendos círculos da vida
Erras, clamando, aflita e delirante.
Ao céu levantas a alma soluçante,
De preces e de súplicas ungida.

Dentro do teu clamor exulcerante,
Sem rumo e só, de dores combalida,
Vagas por esses círculos, perdida,
E giras nesse sorvedouro estuante.

Buscaste o amor; e o mundo era um deserto!
Teu coração, de lágrimas coberto,
Em vão gritou por quem o acalentasse.

O amor nos ermos corações morrera
Árvores augusta, em plena primavera,
Que um sol maldito e bárbaro queimasse!


Artur de Sales, poeta, tradutor e escritor brasileiro (1879-1952)


Maria Magdalena Oosthuizen Artist


Photo:  https://www.pinterest.pt/cinafraga/

domingo, 3 de março de 2019





O Corpo não Espera



O corpo não espera. Não. Por nós
ou pelo amor. Este pousar de mãos,
tão reticente e que interroga a sós
a tépida secura acetinada,
a que palpita por adivinhada
em solitários movimentos vãos;
este pousar em que não estamos nós,
mas uma sede, uma memória, tudo
o que sabemos de tocar desnudo
o corpo que não espera; este pousar
que não conhece, nada vê, nem nada
ousa temer no seu temor agudo...

Tem tanta pressa o corpo! E já passou,
quando um de nós ou quando o amor chegou.


Jorge de Sena





Imagem: https://www.pinterest.pt/cinafraga/