sexta-feira, 21 de abril de 2017





É por ti que escrevo que não és musa nem deusa
mas a mulher do meu horizonte
na imperfeição e na incoincidência do dia a dia
Por ti desejo o sossego oval
em que possas identificar-te na limpidez de um centro
em que a felicidade se revele como um jardim branco
onde reconheças a dália da tua identidade azul
É porque amo a cálida formosura do teu torso
a latitude pura da tua fronte
o teu olhar de água iluminada
o teu sorriso solar
é porque sem ti não conheceria o girassol do horizonte
nem a túmida integridade do trigo
que eu procuro as palavras fragrantes de um oásis
para a oferenda do meu sangue inquieto
onde pressinto a vermelha trajectória de um sol
que quer resplandecer em largas planícies
sulcado por um tranquilo rio sumptuoso


António Ramos Rosa


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quinta-feira, 20 de abril de 2017




MULHER DE PRETO


Ela vinha de preto mas trazia
a noite pendurada no vestido.
Porém não era luto mas alegria
ou a cor do pecado anoitecido
ou talvez fosse a lua que nascia
na parte do seu rosto mais escondido.
Ela vinha de preto e resplandecia
porque era a própria noite que a vestia.



Manuel Alegre






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Rosa Lobato de Faria 85 anos



Beijo a Beijo

E de novo a armadilha dos abraços.
E de novo o enredo das delícias.
O rouco da garganta, os pés descalços
a pele alucinada de carícias.
As preces, os segredos, as risadas
no altar esplendoroso das ofertas.
De novo beijo a beijo as madrugadas
de novo seio a seio as descobertas.
Alcandorada no teu corpo imenso
teço um colar de gritos e silêncios
a ecoar no som dos precipícios.
E tudo o que me dás eu te devolvo.
E fazemos de novo, sempre novo
o amor total dos deuses e dos bichos.

Rosa Lobato Faria, 
in 'Dispersos'


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quarta-feira, 19 de abril de 2017




FRUSTRAÇÃO

Foi bonito
O meu sonho de amor.
Floriram em redor
Todos os campos em pousio.
Um sol de Abril brilhou em pleno estio,
Lavado e promissor.
Só que não houve frutos
Dessa primavera.
A vida disse que era
Tarde demais.
E que as paixões tardias
São ironias
Dos deuses desleais.

Diário XV


Miguel Torga - A Criação do Mundo


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terça-feira, 18 de abril de 2017




Escrevi-te versos perfumados
nos pingos da água fresca
das chuvas da madrugada!
No tempo e no infinito
do feitiço das palavras
cantei amor em céu aberto
numa melodia com o teu nome!
Gastei palavras ao vento
rimas alheias à saudade
para deter o tempo
e não despertar do sonho
onde moravas!
O mesmo sonho
onde desenhei teu rosto
e os contornos da tua boca
para marcar no teu sorriso
os meus beijos
vestidos de paixão e loucura.
Na face fria do tempo
deixo o teu silêncio falar,
e perto da alma
sopro um grito
para te sentir perto de mim,
pois amar-te, foi o meu pecado!
Agora adormeço o meu sonho
e vivo com o teu fantasma
(na minha cama)
pois das chuvas da madrugada
fica apenas a minha sede
de te beber… em AMOR.
[ © António Carlos Santos ]
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Poema: " chuvas da madrugada "
de: © António Carlos Santos
António Carlos Santos




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VIDA


Amparada num seio de mulher.
Mãe, sangue, amor, ternura, semente, terra.
Olhava essa mulher com esperança o céu estrelado.
Contava luas novas.
Seriam as nove luas o abrir da natureza de um humano ser.
Rasgou a pele, o fundo do ventre contraiu.
Explida fui como semente, que rasga seu casulo, talvez rompa um véu.
A mulher esqueceu a dor do esventrar sangrado o corpo em dor.
Encantada olhava a flor.
Me olhou, seu coração bateu.
Jurou ali perante a minha fragilidade amor.
Foi todo meu seu seio e regaço.
Foi todo meu seu enlevo,
Até me deu o seu cansaço.
Quando eu chorosa rasgava seu sono sereno.
Fitava com seu olhar azul céu
As gotas límpidas de mar que era meu olhar.
Num embalar de inocente ternura.
Adormecia ao peito sua flor.
Mas porque veloz o tempo foge?
Mas porque os cavalos brancos rasgam as nuvens do sonho.
A vida tem altas marés.
Sonhos irrealizáveis.
Mas memórias franjadas em recortes de asas de anjos ou aves.
Resta apenas, reconhecer a grandeza de vida dar.
Ter tantas saudades.
Mas hestoicamente viver e amar.
Vamos! Toca a caminhar.

Augusta Mar.


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Disse-te um dia
... que havia de dar-te uma estrela
tão real como os sonhos
do rio Guadalquivir
e o perfume adolescente
do teu corpo
a ondular na aurora de Sevilha
Não foste comigo a Barcelona
ver as pesadas corolas e os mosaicos
de La Pedrera
mas espera-me no aeroporto
de nunca antes
o rumor febril dos teu olhos
onde aprendi
que o tempo não existe
Mas a vida pode ser
também mágoa escura
bem sabes Por isso te prendo
as mãos sobre as ancas
para não fugirmos mais um do outro
e bebo todo o sol e afinal o tempo
nos teus lábios.



Urbano Tavares Rodrigues, 
em "Horas de Vidro"


Foto: pesquisa google