sábado, 23 de maio de 2020

O poeta, escritor e presidente da Sociedade Portuguesa de Autores, José Jorge Letria, escreveu um poema sobre o confinamento a que a pandemia do Covid-19 obriga.








Esta ausência não foi por nós pedida,
Este silêncio não é da nossa lavra,
Já nem Pessoa conversa com Pessoa,
Com o feitiço sempre imenso da palavra
Este tempo só é o nosso tempo
Porque é nossa a dor que nos sufoca
E faz de cada dia a ferida entreaberta
Do assombro que esquivando-se nos toca
Esta ausência é dos netos, dos filhos, dos avós,
É a casa alquebrada pelo medo,
É a febre a arder na nossa voz
Por saber que o mal a magoa em segredo
Este silêncio é um sussurro tão antigo
Que mata como a peste já matava;
Vem de longe sem nada ter de amigo
Com a mesma angústia que nos castigava
Esta ausência é uma pátria revoltada
Que se fecha em casa sempre à espera
Que a febre não a vença nem lhe roube
A luz mansa que lhe traz a Primavera
Esta casa somos nós de sentinela,
À espera que a rua de novo nos console
E que festeje debruçada à janela
A alegria que só nasce com o sol
Esta ausência mais tarde há-de ter fim,
Por nada lhe faltar nem inocência;
Que se escute o desejo de saúde
Anunciando que vai pôr fim à inclemência
Que se abram as portas e as janelas,
Que o medo, derrotado, parta sem destino
Por ser esse o sonho colorido
Que ilumina o riso de um menino.


José Jorge Letria

(20 de Março de 2020)







Fonte:  https://expresso.pt/coronavirus/2020-03-21-Jose-Jorge-Letria-escreve-poema-sobre-o-covid-19-A-Vida-Triunfa-em-Casa





Poema VII: 24 de Simônides de Ceos



Videira, mãe da uva e do vinho que tudo apaziguas,
    possa a teia de tuas gavinhas tortuosas
florescer, exuberante, no chão fino e coroar
    a estela da tumba do teano Anacreonte,
para que ele, festeiro e ébrio do vinho a que é tão dado,
    tangendo sua lira de amante de rapazes
noite afora, sob a terra, tenha acima da cabeça
    os galhos com o esplêndido racimo maduro,
e que possa umedecê-lo sempre o sereno da noite
    que sua boca de ancião tão doce respirava.




Do livro Poemas da Antologia grega ou palatina.
Tradução José Paulo Paes

Simônides de Ceos (c. 556 - c. 468 a.C.)

sábado, 2 de maio de 2020






Celeste


É tão divina a angélica aparência
E a graça que ilumina o rosto dela,
Que eu concebera o tipo da inocência
Nessa criança imaculada e bela.
Peregrina do céu, pálida estrela,
Exilada da etérea transparência,
Sua origem não pode ser aquela
Da nossa triste e mísera existência.
Tem a celeste e ingênua formosura
E a luminosa auréola sacrossanta
De uma visão do céu, cândida e pura.
E quando os olhos para o céu levanta,
Inundados de mística doçura,
Nem parece mulher - parece santa.



Adelino Fontoura, poeta, jornalista e ator brasileiro 1859-1884

terça-feira, 28 de abril de 2020



Jesus Helguera Painter



28 de Abril, dia do Sorriso








28 de Abril dia do sorriso


Soneto da saudade



Quando sentires a saudade retroar
Fecha os teus olhos e verás o meu sorriso.
E ternamente te direi a sussurrar:
O nosso amor a cada instante está mais vivo!
Quem sabe ainda vibrará em teus ouvidos
Uma voz macia a recitar muitos poemas...
E a te expressar que este amor em nós ungindo
Suportará toda distância sem problemas...
Quiçá, teus lábios sentirão um beijo leve
Como uma pluma a flutuar por sobre a neve,
Como uma gota de orvalho indo ao chão.
Lembrar-te-ás toda ternura que expressamos,
Sempre que juntos, a emoção que partilhamos...
Nem a distância apaga a chama da paixão




Guimarães Rosa