sábado, 23 de maio de 2020





Poema VII: 24 de Simônides de Ceos



Videira, mãe da uva e do vinho que tudo apaziguas,
    possa a teia de tuas gavinhas tortuosas
florescer, exuberante, no chão fino e coroar
    a estela da tumba do teano Anacreonte,
para que ele, festeiro e ébrio do vinho a que é tão dado,
    tangendo sua lira de amante de rapazes
noite afora, sob a terra, tenha acima da cabeça
    os galhos com o esplêndido racimo maduro,
e que possa umedecê-lo sempre o sereno da noite
    que sua boca de ancião tão doce respirava.




Do livro Poemas da Antologia grega ou palatina.
Tradução José Paulo Paes

Simônides de Ceos (c. 556 - c. 468 a.C.)

sábado, 2 de maio de 2020






Celeste


É tão divina a angélica aparência
E a graça que ilumina o rosto dela,
Que eu concebera o tipo da inocência
Nessa criança imaculada e bela.
Peregrina do céu, pálida estrela,
Exilada da etérea transparência,
Sua origem não pode ser aquela
Da nossa triste e mísera existência.
Tem a celeste e ingênua formosura
E a luminosa auréola sacrossanta
De uma visão do céu, cândida e pura.
E quando os olhos para o céu levanta,
Inundados de mística doçura,
Nem parece mulher - parece santa.



Adelino Fontoura, poeta, jornalista e ator brasileiro 1859-1884

terça-feira, 28 de abril de 2020



Jesus Helguera Painter



28 de Abril, dia do Sorriso








28 de Abril dia do sorriso


Soneto da saudade



Quando sentires a saudade retroar
Fecha os teus olhos e verás o meu sorriso.
E ternamente te direi a sussurrar:
O nosso amor a cada instante está mais vivo!
Quem sabe ainda vibrará em teus ouvidos
Uma voz macia a recitar muitos poemas...
E a te expressar que este amor em nós ungindo
Suportará toda distância sem problemas...
Quiçá, teus lábios sentirão um beijo leve
Como uma pluma a flutuar por sobre a neve,
Como uma gota de orvalho indo ao chão.
Lembrar-te-ás toda ternura que expressamos,
Sempre que juntos, a emoção que partilhamos...
Nem a distância apaga a chama da paixão




Guimarães Rosa

segunda-feira, 20 de abril de 2020







Poema, beijo, estrela, afago…
Outra coisa que o corpo há quem conheça.
Eu não. Somente nele me cumpro viva.
Poema, beijo, estrela, afago, intriga
Só no corpo me são pés e cabeça.
E coração também que às vezes teça
Razão de me saber mais que medida
Nessa trágica trama tão antiga
A que chamam ficar de amor possessa.
E é de novo poema, beijo, afago.
É de novo corpo que te trago
A exótica festa da nudez.
E tudo quanto sinto e quanto penso
Toma corpo no corpo a que pertenço.
E aqui estou: de barro, como vês.



Rosa Lobato de Faria, escritora portuguesa (1932- 2010).