As Uvas e o Vento
Era o tempo de Pushkin,
A primavera plana,
Uma onda no ar
Como a vela pura
De um barco transparente
Ia pelas campinas
Levantando a erva e o aroma
Das germinações.
Perto de Leninegrado os abetos
Dançavam uma valsa lenta
De horizonte marinho.
Numa a Este
Marchavam os motores,
As rodas, a energia,
Os rapazes e as moças.
Trepidava a estepe,
Os cordeiros punham
Sua pontuação nevada
Na imensa extensão da ternura.
Vasta é a União Soviética
Como nenhuma terra.
Tem espaço
Para a menor flor azul
E para a usina gigante.
Tremem e cantam grandes rios
Sobre sua pele extensa
E ali vive
O esturjão que guarda envolto em prata
Diminutos cachos
De frescor e delícia.
O urso nas montanhas
Vai com os pés delicados
Como um antigo monge da aurora
De uma basílica verde.
Mas é o homem o rei
Das terras soviéticas,
O pequeno homem
Que acaba de nascer,
Chama-se Ivan ou Pedro,
E chora
E pede leite:
É ele, o herdeiro.
Largo é o reino e afofado
Com tapetes de erva e neve.
A noite apenas cobre
Com seu diadema frio
A cabeça, o cimo
Dos montes Urais,
E o mar lambe o contorno
De gelo ou terra doce,
Glaciais territórios
Ou países de uva.
Tudo possui:
A terra em movimento
Como uma vasta empresa
Onde deve,
Desde que nasce,
Cantar e trabalhar,
Porque o reino fecundo
É obra de homens.
Antes foi escura a terra,
Fome e dor encheram
O tempo e o espaço.
Então na história
Veio Lênin
Mudou a terra,
Depois Stalin
Mudou o homem
Depois a paz, a guerra,
O sangue, o trigo:
Dificilmente tudo
Se foi cumprindo
Com força e alegria,
E hoje Ivan herdou
De mar a mar a primavera rubra,
Por onde te levo pela mão.
Escuta, escuta
Este canto de pássaros:
Silva a prata no temor molhado
De sua voz matutina,
Eu o persigo entre agulhas
E leques de pinheiros
Outro canto responde,
Povoa-se o bosque
De vozes na altura.
De bosque a bosque cantam,
De semana a semana,
De aurora a aurora mudam
Trios recém-nascidos.
De aldeia a aldeia se respondem,
De usina a usina,
De rio a rio,
De metal a metal, de canto a canto.
O vasto reino canta,
Se responde cantando
Orvalho têm folhas
Na manhã clara.
Sabor de estrela fresca
Tem bosque.
Como por um planeta
Vai lentamente andando
A primavera pela terra russa,
E espigas e homens nascem
Sob seus pés de prata.
(Pablo Neruda)
(Tradução de Carlos Nejar)
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