quinta-feira, 5 de maio de 2022

 

 



 

5 de Maio - Dia Mundial da Língua Portuguesa

 

Languidez

 

Tardes da minha terra, doce encanto,

Tardes duma pureza de açucenas,

Tardes de sonho, as tardes de novenas,

Tardes de Portugal, as tardes d’Anto,

 

Como eu vos quero e amo! Tanto! Tanto!…

Horas benditas, leves como penas,

Horas de fumo e cinza, horas serenas,

Minhas horas de dor em que eu sou santo!

 

Fecho as pálpebras roxas, quase pretas,

Que poisam sobre duas violetas,

Asas leves cansadas de voar…

 

E a minha boca tem uns beijos mudos…

E as minhas mãos, uns pálidos veludos,

Traçam gestos de sonho pelo ar.

 

 

Florbela Espanca, no livro “Livro de Mágoas”. 1919.

 

 

 

sábado, 30 de abril de 2022

 

 



Poema sobre a Guerra

Onde se esconde paz


Slava Ukraini    💙  🇺🇦  💛

 

 

Convoca as bordadeiras, os tecelões e os ourives

e diz-lhes que não haverá mais bodas

até que volte a pronunciar-se de novo a palavra paz

nos mercados, nas veredas, nas alcovas, nos portais.

Ainda ontem uma mãe sepultou dois filhos

no lugar onde antes era luminosa a flor do riso,

a corola branca dos amores sem mácula.

Depois todos se calaram e vieram as lágrimas,

as súplicas, as unhas cravadas na carne ferida.

E foi a raiva, e foi a dor sem nome, a miséria da alma.

É assim a guerra, disseram. E mais não souberam dizer.

E foram os pais despedir-se dos filhos na neblina dos cais.

Quando se voltava era sempre com um pedaço de vida

a menos, com uma cratera aberta no lugar da voz,

com uma chaga viva no vazio do coração.

Depois vieram os cães e as aves soturnas e negras,

as larvas, os ossos crucificados nos ramos ardidos,

os nomes dos filhos, dos pais, dos irmãos

gravados na pedra exausta de tanta morte.

Sempre foi e será assim a guerra, sentenciavam.

Mas havia meninos que ganhavam asas sobre os escombros

e levitavam como palavras do princípio de tudo

sobre os campos das batalhas que nunca ninguém venceu.

E vieram com eles as borboletas, os duendes e os adivinhos

e desenharam na terra o rosto imaculado da paz

e na areia fina o mapa das viagens em direcção à luz.

E com eles regressaram as bordadeiras, os tecelões e os ourives,

e as casas voltaram a ter o odor dos frutos e da alfazema,

o rumor cantante das fontes e das núpcias.

E foi assim a paz, laboriosa como uma mãe altiva.

Ainda ontem uma mãe assim deu à luz dois filhos

com os nomes dos que outra mãe um dia ali sepultara.

E foi assim a paz, como um rio lavando o ventre da terra.

Agora podes adormecer tranquila, mãe, porque os canhões

encheram a boca de vento e morreram sufocados

como carrascos cegos pelo lume do remorso

e deixaram que deles se soltasse uma música antiga,

capaz de fazer das espadas dos heróis

as guitarras que adoçam a alma eterna e livre das manhãs.

 

 

José Jorge Letria (Janeiro de 2007)

 

 

terça-feira, 26 de abril de 2022

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

26 de abril de 1986 - Desastre em Chernobil 


Um lugar lindo, coberto de flores e campinas com lírios-aquáticos no riacho uma abundância de frutinhas e cogumelos...


A 26 de abril de 1986, o reator número quatro do complexo nuclear de Chernobil, na Ucrânia (URSS), explode. A nuvem radioativa afetou países vizinhos, provocou 31 mortes no primeiro dia, contaminou 10 mil quilômetros quadrados e atingiu com as radiações 600 mil pessoas.


Naquele dia a radiação foi lançada no ar, no solo, na água

mais que todos os testes nucleares realizados e todas as bombas detonadas

Uma nuvem de medo, ansiedade, incerteza pairou sobre a vida de milhões de pessoas

A nuvem embrenhou-se pelas plantações de pinheiros cobriu o bosque numa ação radioativa de cinzas

Toneladas de material radioativo lançados na atmosfera

Os liquidadores lacraram o reator transformando num sarcófago de aço e concreto

Perderam o seu lar deixaram tudo para trás roupas, dinheiro documentos, alimentos tudo que possuíam...

Um lugar lindo, coberto de flores e campinas com lírios-aquáticos no riacho uma abundância de frutinhas e cogumelos

Um acidente nuclear

Uma crise social e psicológica com proporções esmagadoras

Só então entenderam que nunca mais voltariam


Marcia Lailin


 

 

 

segunda-feira, 25 de abril de 2022

 

 


 

 

25 de Abril – O dia em que nasceu a Liberdade

 

 

A Cor da Liberdade

 

 

               Não hei-de morrer sem saber

               qual a cor da liberdade.

 

               Eu não posso senão ser

               desta terra em que nasci.

               Embora ao mundo pertença

               e sempre a verdade vença,

               qual será ser livre aqui,

               não hei-de morrer sem saber.

 

               Trocaram tudo em maldade,

               é quase um crime viver.

               Mas, embora encondam tudo

               e me queiram cego e mudo,

               não hei-de morrer sem saber

               qual a cor da liberdade.

 

Jorge de Sena   

(1919-1978)    

 

Viola Sado Artist

 

domingo, 24 de abril de 2022


 Leonard Cohen Street art

 


 

 

 

 


 

 

Esta é a manhã da consciência!

Voemos juntos! Desperta! Segue-me!

Há um lugar livre da dúvida e da tristeza,

Onde o terror da morte não impera.

 

Lá, florescem bosques em eterna primavera,

E sua fragrância faz avançarmos mais e mais.

Imerso nela, o coração, qual abelha, se inebria.

Imenso nela, já não quer outra alegria.

 

Kabir    

 

Bhagat Kabir Yi (San Kabir)

 

(Varanasi, ca. 1440 - Maghar, ca. 1518)

 

 

Kabir  foi um dos grandes poetas místicos ou santos-poetas da Índia medieval (Século XV), cujo escritos influenciaram o movimento bhakti do hinduísmo.