segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017




Neste dia de silêncio e ausência


Neste dia de silêncio e ausência
E tão próxima a tua presença,
O horizonte fala-me de ti
A brisa viaja na minha pele
E as andorinhas
-que construiram ninhos antes da viagem
Prometeram voltar
Para burilar os claustros da saudade

As andorinhas nunca esquecem
A casa inde nasceram...
Fazem voos na promessa do teu sorriso
-como se a vida dependesse de ti

Neste dia de silêncio e ausência
É tão o medo de amar,
O final do prazer é misterioso
A viagem  são corpos com asas...
E as andorinhas
-que parecem ter antes de entrar
Corajosas prometeram voltar.


de Pj.Conde-Paulino 
20/10/2014


Foto: Pinterest.com




Tu que tens os aromas e as cores
Da beleza que invade meu querer
Adornada em paisagens de amores
Adentrando o oasis do meu ser.

O teu corpo se revela como é
No desejo ardente e flamejante
Que exala teu perfume de mulher
E nos leva ao delírio dos amantes.

Entre toques de mãos em peles nuas
Minha boca está sedenta pela tua,
Misturando assim nossas vontades

No bailado dos corpos, a implosão,
E depois que se acalma o coração,
Repousamos na paz que nos invade.


José Bento




Foto e poema:pesquisa google

domingo, 19 de fevereiro de 2017



Onde Estás?

É meia-noite... e rugindo
Passa triste a ventania,
Como um verbo de desgraça,
Como um grito de agonia.
E eu digo ao vento, que passa
Por meus cabelos fugaz:
"Vento frio do deserto,
Onde ela está? Longe ou perto?"
Mas, como um hálito incerto,
Responde-me o eco ao longe:
"Oh! minh'amante, onde estás?. . .

Vem! É tarde! Por que tardas?
São horas de brando sono,
Vem reclinar-te em meu peito
Com teu lânguido abandono! ...
'Stá vazio nosso leito...
'Stá vazio o mundo inteiro;
E tu não queres qu'eu fique
Solitário nesta vida...
Mas por que tardas, querida?...
Já tenho esperado assaz...
Vem depressa, que eu deliro
Oh! minh'amante, onde estás? ...

Estrela — na tempestade,
Rosa — nos ermos da vida;
lris — do náufrago errante,
Ilusão — d'alma descrida!
Tu foste, mulher formosa!
Tu foste, ó filha do céu! ...
... E hoje que o meu passado
Para sempre morto jaz...
Vendo finda a minha sorte,
Pergunto aos ventos do Norte...
"Oh! minh'amante, onde estás?..."

Castro Alves



Fonte: https://www.luso-poemas.net/
Foto: Pinterest.com

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017




Motivo

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.



Cecila Meireles



Foto:https://pt.pinterest.com/cinafraga/

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017





Na Mão de Deus

Na mão de Deus, na sua mão direita,
Descansou afinal meu coração.
Do palácio encantado da Ilusão
Desci a passo e passo a escada estreita.

Como as flores mortais, com que se enfeita
A ignorância infantil, despojo vão,
Depois do Ideal e da Paixão
A forma transitória e imperfeita.

Como criança, em lôbrega jornada,
Que a mãe leva ao colo agasalhada
E atravessa, sorrindo vagamente,

Selvas, mares, areias do deserto...
Dorme o teu sono, coração liberto,
Dorme na mão de Deus eternamente!

Antero de Quental, in "Sonetos"



Fonte: http://www.citador.pt/
Foto: https://pt.pinterest.com/cinafraga/


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017



O Espelho de Água

O meu espelho, mais profundo que a orbe
Onde todos os cisnes se afogaram.

É um tanque verde na muralha
E no meio dorme a tua nudez ancorada.

Sobre as suas ondas, debaixo de céus sonâmbulos,
Os meus sonhos afastam-se como barcos.

De pé sobre a popa ver-me-eis sempre a cantar,
Uma rosa secreta cresce no meu peito
E um rouxinol ébrio esvoaça no meu dedo.

Vicente Huidobro, Chile
1893-1948

(O Mar na poesia da América latina)


Foto:https://pt.pinterest.com/cinafraga/

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017



Os Cinco Sentidos

São belas - bem o sei, essas estrelas,
Mil cores - divinais têm essas flores;
Mas eu não tenho, amor, olhos para elas:
      Em toda a natureza
      Não vejo outra beleza
      Senão a ti - a ti!

Divina - ai! sim, será a voz que afina
Saudosa - na ramagem densa, umbrosa.
será; mas eu do rouxinol que trina
      Não oiço a melodia,
      Nem sinto outra harmonia
      Senão a ti - a ti!

Respira - n'aura que entre as flores gira,
Celeste - incenso de perfume agreste,
Sei... não sinto: minha alma não aspira,
      Não percebe, não toma
      Senão o doce aroma
      Que vem de ti - de ti!

Formosos - são os pomos saborosos,
É um mimo - de néctar o racimo:
E eu tenho fome e sede... sequiosos,
      Famintos meus desejos
      Estão... mas é de beijos,
      É só de ti - de ti!

Macia - deve a relva luzidia
Do leito - ser por certo em que me deito.
Mas quem, ao pé de ti, quem poderia
      Sentir outras carícias,
      Tocar noutras delícias
      Senão em ti! - em ti!

A ti! ai, a ti só os meus sentidos
      Todos num confundidos,
      Sentem, ouvem, respiram;
      Em ti, por ti deliram.
      Em ti a minha sorte,
      A minha vida em ti;
      E quando venha a morte,
      Será morrer por ti.


Almeida Garrett, in 'Folhas Caídas'



Fonte:http://www.citador.pt/

fotos:https://pt.pinterest.com/cinafraga/