sexta-feira, 14 de julho de 2017





O BANQUETE INFINITO

Poesia chorada, como o mar sob a chuva?
Poesia aflita, como um farol no denso nevoeiro?
Poesia angustiada, como a futura mãe?
Alegre o olhar, os meus dedos são mensageiros dos deuses
E cantam o que me sobra e eu não sei entender.
Alegre o coração, escapa-se de mim um fumo de dor,
E enquanto rio, sou também lágrimas e soluços.
O acordo é uma promessa do paraíso perdido mas não morto,
pois as suas portas choram por mim em mim.

Poesia triste, triste face, coração ardente, sorriso imanente,
Tudo se comprime num verso obscuro e intocável.
Julgo perder-me num meandro de luzes e sombras,
De estrelas e pântanos, profetas e deuses.
Tarda-me a achar o caminho dos caminhos.
Aquele que, enfim, conduz a alguma parte.
Sei que tudo é — mas como conhecer o que, sendo, indica e ilumina?
Os meus gestos são pesados e lentos, pois temem
Matar o inocente e dar vida ao monstro.
Já não hesitam, porém, e quando eu puder olhar atrás de mim
A estrada percorrida, os destroços abandonados,
Os cadáveres imolados à vontade torturada,
Então sabereis os frutos a escolher e os manjares a saborear
espera-me o banquete infinito.

Iguaria ou conviva, o que importa é chegar com o destino cumprido.

António Quadros


Foto: https://www.pinterest.pt/cinafraga/

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